quarta-feira, 27 de março de 2019

MEMÓRIA DA MÚSICA NORDESTINA


Acervo Jorge Mello: um recanto de cuidados para com memórias nacionais

Um acervo que funciona na cidade de Embú-Guaçu, no estado de São Paulo, a 48km da capital, guarda a memória de toda uma geração da Música Popular Brasileira, além de arquivar folhetos de cordel piauienses da década de 50. Seu responsável é o cantor e compositor Jorge Mello, artista surgido no interior do movimento denominado “Pessoal do Ceará” – cujos integrantes são, dentre outros, Raimundo Fagner, Ednardo, Rodger Rogério e Teti -, que invadiu o eixo Rio-São Paulo e se firmou como marco importante para a canção nacional.
Desde muito jovem, Mello, sem nenhuma pretensão futura, iniciou o armazenamento de uma série de documentos – isto na época em que já trabalhava na tradicional bodega de seu pai, em Piripiri, no interior do Piauí. Entre eles, revistas em quadrinhos, material poético de cantadores repentistas e fotogramas de filmes da época. “O interessante é que desde meados da década de 1950, eu junto e guardo esses documentos até hoje. Tenho muitos folhetos de cordel no acervo. Milhares deles! Grande parte adquiridos naqueles anos dourados como ajudante de bodegueiro com meu pai.”

Quero dizer com isso que sou um guardador de papéis. Nunca os jogo fora, conta.

A história do arquivo se confunde com a trajetória artística de seu memorialista. Aos 15 anos, Jorge foi estudar em Teresina e lá, nesta mesma idade, teve seu primeiro poema publicado. Logo após, crônicas. Guarda tudo e vai para Fortaleza, no Ceará, com o fim de se lançar cantor na televisão. Aos 17, passa a integrar um programa na TV Ceará e a participar de festivais de música na cidade. Visto isso, matérias surgem em veículos impressos. Mello não deixa de armazenar. Confundido com sua própria história, está a de seus companheiros musicais. Compactos raros de Fagner, por exemplo, são documentos facilmente encontrados nas caixas do acervo.
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Compacto Duplo “Felicidade Geral”, 1972 – Um dos registros fonográficos raros que podem ser encontrados no acervo / Foto: Reprodução.
Belchior, artista cearense que fez sucesso na década de 70 com canções como “Apenas um Rapaz Latino-Americano” e “Velha Roupa Colorida”, é um dos maiores parceiros de Jorge. Com ele, o arquivista manteve uma íntima amizade e também uma parceria comercial de sucesso a partir da fundação da produtora Paraíso Discos e da editora Constelações – responsáveis pela gravação de centenas de outros cantores. Foi com o famoso desaparecimento deste, no ano de 2007, que teve a ideia de organizar seus materiais. “Só vim ter consciência do que tinha guardado, com o desaparecimento do Belchior em 2007. Porque vi chegarem a minha casa os veículos de imprensa à procura de notícias para suas pautas e encontraram tudo o que queriam. Eu via a admiração daqueles jornalistas pelo que eu guardara. Foi quando passei a organizar melhor aquela bagunça”, relata.
O mais cativante é que o memorial é um espaço aberto e gratuito. Todos podem entrar, mexer nos documentos e levar cópias para casa. É, sobretudo, um espaço para a liberdade da pesquisa e, também, para a produção cinematográfica. São mais de 50.000 documentos, tudo mantido com fundos financeiros particulares do seu curador. Desde a construção do espaço, e transporte dos documentos, ao pagamento dos custos fixos próprios do local. Os amigos de geração também ajudam, mas com a contribuição de CD’s, matérias veiculadas na imprensa, fotos e peças multimídia em geral.
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Jorge Mello e Antônio Carlos Belchior, uma parceria fundamental para a Música Popular Brasileira / Foto: Acervo Pessoal
Embú foi escolhida para locar o acervo por inúmeros motivos. Entretanto, o mais interessante é que Jorge, inicialmente, comprou a propriedade com o objetivo de colocar seus netos em contato mais profundo com a natureza. Mello é um artista nordestino, enfiado no interior de São Paulo e, nos seus 70 anos de idade, prefere a calmaria do sítio ao fervilhar da metrópole. Como todo compositor incansável, continua escrevendo e somando peças ao seu cancioneiro.
Caso tenha mais curiosidade sobre a obra de Jorge Mello, muito facilmente podem ser encontradas entrevistas – Como, por exemplo, a que concedeu a Jô Soares e a do Programa Nomes do Nordeste, gravado no Centro Cultural Banco do Nordeste – no YouTube e textos variados – como um verbete no Dicionário Cravo Albin de Música Brasileira – na internet.  
FONTE: Blog MESA 22
RAFIQUE NASSER

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