Para Fausto Nilo, Gonzaga integra o panteão da música feita no Nordeste junto ao paraibano Jackson do Pandeiro e à cantora pernambucana Marinês
FOTO: NAH JEREISSATI
Fausto Nilo
é autor da última música gravada em estúdio por Luiz Gonzaga
Por Diego Barbosa
O disco "Veredas
Nordestinas", de Dominguinhos, lançado em 1989, traz a última gravação em
estúdio feita por Luiz Gonzaga com autoria do cearense Fausto Nilo
Está em "Veredas
Nordestinas", disco de Dominguinhos, lançado em 1989, a última gravação em
estúdio realizada por Luiz Gonzaga. A constatação é de pesquisa realizada por
Paulo Vanderley, estudioso do Rei do Baião. "O Juazeiro e a sombra",
ao trazer à superfície descrições sobre as cores do sol, o caminhar por
estradas e a resistência, traduz a paisagem sertaneja em cada verso e foi
gestada exatamente para bradar as minúcias do ambiente.
Em entrevista ao
Verso, o músico e arquiteto cearense Fausto Nilo, compositor da canção, conta
que o título nasceu a partir do nome de uma das fazendas de Quixeramobim,
município onde nasceu. "Ela se chamava 'Juazeiro da sombra'. Mas, não sei
por que, quando estava escrevendo a letra, coloquei na cabeça que ficaria 'O
Juazeiro e a sombra'", afirma.
O próprio Dominguinhos
havia pedido a Fausto Nilo que escrevesse a música para cantar junto com
Gonzaga. "E o Luiz compreendeu o espírito, o que me deixou muito feliz.
Dominguinhos me contou que ele se emocionou muito durante o processo. A
gravação ficou realmente bastante linda", observa.
Não foi a primeira vez
que Nilo teve canção gravada pelo Rei do Baião. Antes, "Depois da
derradeira", em 1981, uma música de São João, marcava a parceria entre o
trio Fausto, Gonzaga e Dominguinhos. "Isso foi antes de ele ficar doente,
o que coloca 'O Juazeiro e a sombra' realmente como a última que ele gravou em
estúdio".
Memórias
Ao evocar a lembrança,
o músico e arquiteto se demora em emoções. Situa que tudo é de grande
importância para ele porque remete diretamente às primeiras memórias carregadas
a tiracolo de quando criança, ao escutar Gonzagão na vitrola e já apreciar sua
desenvoltura.
"Para mim, foi o
máximo ter uma letra interpretada por ele. Imagine uma criança que ouve uma
pessoa com uma admiração profunda e, um dia, essa pessoa dá vida ao que você
criou. Talvez uma das coisas mais importantes da minha carreira de autor tenha
sido ser gravado pelo Gonzaga duas vezes".
Ainda enquanto menino,
Fausto recorda da passagem de Luiz por Quixeramobim. À época, havia passado
toda a tarde na casa em que ele estava hospedado, olhando, de longe, a magia
que emanava do homem. "Eram uns três ou quatro músicos reunidos; eles ali
numa sala e eu só olhando. Nunca imaginava que, um dia, a voz dele ia soar numa
letra minha".
Quanto à influência
que Gonzaga deixou para o Ceará - mesmo sendo ele natural de Exu, em Pernambuco
- Fausto comenta que é uma herança incontornável, mencionando que a juventude
do artista foi em Fortaleza, onde fez muitos amigos e conseguiu desenvolver
estreito contato com a cidade.
"Recordo de ele
chegando no povão, e não na elite. Quando criança, tinha uma visão de que a
classe média, os mais ricos, não escutavam sua música. Pessoas mais comuns,
não, sempre o escutaram. Depois do Tropicalismo, quando nomes como Caetano
Veloso e Gilberto Gil valorizaram sua imagem, é que ele ganhou audiência também
no meio intelectualizado. Mas é importante considerar que Luiz Gonzaga foi um
artista do povo, de muita popularidade".
O Juazeiro e a sombra
(Dominguinhos e Fausto Nilo)
As cores do sol,
constelações do chapéu
O Juazeiro e a sombra,
e a saudade quase no céu
As flores de Liz,
anotações sem papel
Os versos que fiz, só
por gostar de você.
Eu peço à luz do
sertão, pra brilhar,
Sobre as promessas do
seu Ceará,
Eu faço você feliz, ao
contrário da vida que morre no chão,
Só tenho o meu
coração, pra cantar
E sentimentos pra rir
ou chorar
Mas eu não posso
mentir pra você,
Que o remédio é
cantar.
Pra que caminhar,
Se agora estamos aqui,
No meio da estrada,
Que o destino
escolheu.
São as cores do sol,
constelações do chapéu
O Juazeiro e a sombra,
tudo isso sou eu.
Pra que caminhar,
Se agora estamos aqui,
No meio da estrada,
Que o destino
escolheu.
São as cores do sol,
Constelações do chapéu
O Juazeiro e a sombra
Tudo isso sou eu
*Agradecimento
especial ao pesquisador Paulo Vanderley, que prestou consultoria para a
realização desta série de reportagens sobre os 30 anos de saudade de Luiz
Gonzaga
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